quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Aquele do Efeito Borboleta

Sophia encarava as estrelas que havia pintado no teto de seu quarto enquanto se preparava para tentar começar mais um dia. Respirou fundo e finalmente levantou-se e acionou seu “automático” de todo dia: banho, café, escovar os dentes, uniforme, café, escola. Após um ano seu estado não mudou. Como já estava atrasada, pensou, iria a pé para a escola, para deixar o vento gélido e gostoso do inverno bater na cara e clarear as idéias. Já na rua, colocou os fones com o mais que habitual Iron Maiden no volume máximo e enormes óculos de sol, e começou a atravessar a cidade em direção ao reduto das piores memórias que tinha em sua cabeça.  Pegou o caminho mais longo justamente para sofrer mais um pouco e passar na frente dos restos da casa incendiada na qual passou seus melhores momentos. E ali estancou, ouvindo o clichê Last Kiss – música que seria a melhor trilha sonora para a cena caso sua vida fosse um filme. Olhou para a rua, a qual estava deserta e pensou se poderia ficar pior que já está. Concluiu que não. Entrou em meio aos restos do que já fora um lar, uma estúpida quantidade de lixo e até roupas de prováveis moradores de rua. Dane-se, eu vou terminar algo na minha vida, pensou. Chegando onde já havia sido um quarto, sentou numa pilha enorme de entulhos e pegou o antigo e surrado diário na mochila, folheando até o dia 28 de agosto do ano anterior. Respirou fundo, sabendo das possíveis conseqüências do que faria. Riu consigo mesma, afinal precisava tentar novamente após tantas falhas. Começou a ler o que estava escrito:

                Estou de saída para casa do Théo, realmente não sei o que esperar sobre esta noite....

Bastou ler o nome que as próximas letras já ficaram embaralhadas, ela começou a tremer e tudo começou a mudar. Já acostumada com essa parte, Sophia apenas se deixou levar por essa pequena viagem metafísica de fato. Tudo ficou escuro por alguns segundos e de repente se viu em 2010 em um quarto a luz de velas e aquele que ela sempre amou. A urgência tomou conta de sua mente, mas seu corpo agiu como se não soubesse de sua missão. Atirou-se na direção dos 1,80m dele e se deixou levar. Após beijos e carícias, abriu os olhos, e viu em sua visão periférica o fogo da vela.  Anda, vamos caminhar, disse ela fingindo estar calma; prefiro continuar isso, disse ele sorrindo; não, eu quero caminhar, insistiu ela, juro que depois te recompenso, sorriu insegura; ele bufou mas concordou. A mais de cinco quadras da casa, não viram quando ela sucumbiu em chamas; a mais de mil quilômetros de distância, sonhando alto, não viram o carro se aproximando e ali tiveram seu fim. Mútuo, já na 3ª ou 4ª tentativa, não se sabia muito bem. As lápides estão lado a lado hoje. Os pais de ambos hoje são deprimidos, e daí.  A Sophia de 2011 - já egoísta por conta de tudo que havia passado - não existe, mas mesmo assim é possível dizer que está mais feliz onde está do que antes. É melhor morrer de verdade, atropelada e desfigurada por um carro, que morrer  pouco a pouco internamente certo? É até mais saudável.

Nenhum comentário:

Postar um comentário